É muito raro eu me interessar por filmes brasileiros. Para aqueles que
acompanham este blog isso é bem fácil de se notar. Mas não é nenhum tipo
de preconceito com o cinema nacional, é que simplesmente as produções
feitas por aqui não me atraem em absolutamente nada. Posso estar
generalizando demais, mas estou realmente farto de filmes em favelas ou
que se pareçam com uma novela da globo. É claro que filmes realmente
bons, como os espetaculares Cidade de Deus, Tropa de Elite e Tropa de Elite 2,
foram conferidos e merecidamente elogiados por mim, pois a estrutura do
filme, o roteiro e tudo mais tornaram esses filmes atraentes ao meu
gosto particular. E foi justamente este gosto particular que fez meus
olhos brilharem quando vi o trailer de 2 Coelhos, me dando muita
vontade de conferir esta produção. E finalmente aparece um filme
brasileiro que, mesmo copiando outras referências hollywoodianas (e
copiando muito bem por sinal) tenta algo diferente e divertido.
E onde está a chave para ter se tornado um filme tão interessante? É
fácil explicar, e vamos começar pela mais básica e mais importante peça
de um filme: o roteiro. Com uma trama muito interessante, cheia de
reviravoltas e trapaças, alianças improváveis e planos mirabolantes, o
roteiro conta uma história que lembra muito os bons filmes do diretor
inglês Guy Ritchie (de Snatch e Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumengantes).
Existem sim alguns momentos meio improváveis que podem ser considerados
furos de roteiro, mas nada que estrague a experiência, pois mantém o
interesse constante e a cada "plot twist", explode a cabeça do
espectador.
Em segundo lugar, podemos destacar o visual do filme. Muito arrojado,
rápido e videoclíptico, lembra também alguns momentos dos filmes de Zach Sneider e de Guy Ritchie, usando bastante de câmeras lentas (nos
momentos certos, sem abuso), devaneios bizarros em mundos estranhos, e
muitas paradas para colocar o nome do personagem na tela. As cenas de
ação foram muito bem filmadas, assim como os inúmeros tiroteios que
ocorrem. Em especial, cito uma ótima cena, muito bem montada, onde a
câmera passeia pelo quarto, atravessando o cano da arma de um
personagem, passando por trás deste mesmo quarto para mostrar a
emboscada, somente para sair pelo cano de outra arma, acompanhando o
primeiro tiro que precede a saraivada de chumbo. Novamente, nada
extremamente original, mas muito bem executado e encaixado com o
restante do filme. Em cima de tudo isso, a montagem não-linear do filme
(influência direta de Quentin Tarantino) fecha o pacote visual para
contar uma história excelente.
Em terceiro, podemos destacar os personagens. Não vou ficar descrevendo
um a um, pois posso sem querer entregar um spoiler que pode arruinar a
surpresa daqueles que pretendem conferir o longa. Mas posso dizer que
todos os personagens são ótimos, sendo fácil o público sentir empatia ou
ódio por eles. E a dualidade que existe em todos, nos faz mudar de
opinião o tempo todo conforme o enredo vai se desenrolando. E isso se
aplica a todos, sejam os "heróis" Edgar e Walter, a desejada Julia ou o
ótimo vilão Maicom. Até mesmo os capangas de Maicom são divertidos,
proporcionando algumas das cenas mais engraçadas, num humor negro típico
novamente dos filmes de Guy Ritchie. A escolha dos atores para viverem
estes papéis foi muito inspirada, estão todos ótimos e caíram como uma
luva nestes papéis. E pra embalar tudo isso, uma ótima trilha sonora,
compostas por músicas estrangeiras e nacionais (prepare-se para ouvir
muito Titãs).
O trailer já tinha me surpreendido, mas não sabia o que esperar do filme
dirigido e escrito por Afonso Poyart. Ao conferir a obra, fiquei ainda
mais impressionado com o resultado final. Pode ser acusado de copiar um
estilo americano (ou inglês), mas isso não é obrigatoriamente uma coisa
ruim. Eu considero que foi algo muito corajoso e que precisa ser feito
para levar mais pessoas aos cinemas para conferir o cinema nacional. Não
entendo o motivo de não serem produzidos filmes de gênero no Brasil. Se
Espanha, México, Japão e Coréia conseguem produzir ótimos filmes de
terror por exemplo, por que o Brasil não pode se arriscar também nesse
gênero, e se mantém fazendo sempre as mesmas coisas? Se for para eu
escolher entre ver mais um dramalhão de favela ou um filme de ação que
imita o Guy Ritchie, com certeza eu escolho o que imita Guy Ritchie.
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